sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Laço Indissolúvel

A mulher perambulava de um lado para o outro a procura da resposta. Era o seu objetivo único e derradeiro, sua sentença de vida ou de morte. Um enigma a ser desvendado que lhe danificava o cérebro à medida que tomava forma em proporções inimagináveis. Laço indissolúvel, rasgado és!

O corpo magro e abatido, cabelos soltos na altura dos ombros, um olhar profundo e sem expressão faziam-na passar quase despercebida, não fosse o fato de balbuciar o tempo todo palavras cujo conteúdo era apenas a sequência sintática de morfemas. Enquanto seus pés descalços sofriam a ação da calçada quente e suja, entre os dedos o acúmulo de dejetos formava aquela camada espessa: a proteção da imundície. Ora refletia-lhe a luminosidade natalina, ora ouvia o som da ruptura dilacerante. As mãos trêmulas agarravam-se às paredes e vitrines nas quais a superfície lisa e impecável estabelecia um contraste entre o dia e a noite. O abdômen contraído revelava parte da estrutura do corpo. Andava cansada de viver.

A indivisibilidade indecifrável tomava conta de todos. O que tão profundamente unir-se-ia infringindo a elegância e a normalidade?

A reciprocidade se dissipa quando inexiste o sentimento de amor e o respeito não guarda mais o decoro. A maneira de pensar e julgar é um projétil disparado, certeiro – não há escudo protetor. –Ah! esse enigma que me mata!

...e mata mesmo, aos poucos, rumina a vítima, estraçalha-a!

O poder, porém, está tão próximo e tão longe ao mesmo tempo. Aquele que mata pode, também, fazer viver em plenitude. E amar, e amar, e amar. O sangue que flui nas veias guarda o segredo tão decifrável, é um ímã: o DNA.

A mulher continua, anda. O DNA não a salvou. O maldito tornou sua vinda um inferno na Terra, mortificou-a, mas ela, ainda assim, o carrega e protege, como um pássaro que cuida do seu filhote no ninho. Busca incansavelmente comida, preocupa-se incondicionalmente. Enquanto há forças, há vida, e no cérebro que já se decompõe resta a esperança de que a existência não seja apenas a transmissão de caracteres hereditários, mas que se possa compreender a individualidade como bênção divina.

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